quarta-feira, 14 de julho de 2010

Visão de espanto

Oh, bárbara tristeza:
O sobreiral, numa revolta muda,
Em mágica e fantástica beleza,
Sangrento, se desnuda!
Atrai-me esta tortura
Do trágico arvoredo,
Esta amargura
De fulvo espanto, de ansiedade e medo!

Olho a distância, o sol vermelho, ao fundo:
O sol tomou a cor do «sobro» mutilado…
E visões de outro mundo
Acordam, de repente,
Á flor do mar desvairado
Da minha fantasia incandescente!

terça-feira, 13 de julho de 2010

Maria Triste

Maria Triste, como tu mudaste,
Como sorriste no teu São Martinho,
Inebriante e forte como o vinho,
Foi numa taça ardente que o tomaste!

E refloriste como a primavera!
Primavera em novembro, Santo Deus!
E tanto sol brilhou nos olhos teus
Que tu foste a rainha da Quimera!

Também, no meu jardim, em certo dia,
(Milagres do verão de São Martinho…)
O espinheiro floriu, branco de arminho:
Como se fosse em pleno Abril, sorria…

Mas foi pequena a derradeira festa…
Voltou o frio; a flor morreu, gelada…
Foi um adeus à vida, um quase nada,
Que assim matou a pobre flor modesta!

Maria triste, olha, tem cuidado,
Se a tua primavera já passou,
Não queiras renová-la, pois findou;
Na vida não tornamos ao passado…

A esse tempo não se volta mais;
Passa um dia por nós, rapidamente,
Mas não torna a florir, dentro da gente,
E, pelo outono, há sonhos irreais.

Crisântema doirada, eu te lamento!
Nunca, nunca tiveste primavera,
E ficaste, num sonho, à sua espera
P’ra seres desfolhada pelo vento…

Bonecos de Estremoz

Bonequinhos de barro de Estremoz!
Floridas cantarinhas! primaveras !
Figuras dum presépio de quimeras!
Quem foi que lhes deu vida no meu sonho?
Eterna fantasia cor de luz,
Milagre suavíssimo, risonho,
Do Menino Jesus…

Horas da minha infância, luminosas,
Da minha crença infinda…
Que até mesmo nas sombras dolorosas
Me iluminam ainda!

- Pelos campos de musgo vão subindo,
Em marcha vagarosa,
Pastores e rebanhos! Sonho lindo,
De quando a nossa vida é cor de rosa!
Um mundo de brinquedos, de alvo encanto,
O mundo em que eu vivi,
De quando sempre em nós é dia santo
E tudo nos sorri!

Lá vão os Reis Magos,
De olhos fitos na estrela que rebrilha,
Reflectindo no espelho azul dos lagos,
A sua luz, doirada maravilha!
Estrelinha anunciando milagrosa
A vida do Menino…
No céu da tela, vibra, luminosa,
Com um fulgor divino!
E, no presépio, além,
O nosso Bom Jesus de olhar profundo…
São José… Sua Mãe:
Eis o poder do Mundo!

Cenário de ilusões! Ainda, agora,
De olhos ardentes, vou fitar-te em vão…
Não sinto em mim aquela paz de outrora…
Mas deixa-me sonhar o coração!

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Cair da tarde

Desfolham-se os rosais do meu jardim…

Tão leve como doce sombra de ave,
Num palpitar suave
De penas de cetim,
Que a noite desça, agora, sobre mim…

Espírito perdido

Toda a planície funde-se no Céu;
Apaga, na distância, a sua imagem!
Meu pensamento vasto, irmão do seu,
Em busca do meu ser que se perdeu,
Esfumou-se na sombra da paisagem!
- Planície, minha irmã, vem ajudar-me,
Eu quero, em ti, sentir-me novamente:
Nos teus longes cinzentos encontrar-me,
Para depois calar o som de alarme
Que, em mim, se repercute estranhamente,
E sangra como a luz dum fúnebre poente…