segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

SILÊNCIO

O silêncio povoou-se de mistério,
de murmúrios de sombras, de lembranças
passadas de amargura! em um império
do mais atroz domínio… não descansas,
oh doida inquietação, de me ferir…
de me rasgar de todo o coração,
cansado de bater, ansioso de partir!
Espectros de mim mesma avultam na distância,
perdidos no jardim da minha infância!
Das rosas que esfolhei, ao longo do caminho,
é tudo noite morta, lívido abandono,
tristeza, vago outono,
poeira que o vento leva em desalinho…

AQUELA SAUDADE

Aquela saudade,
pregada no peito,
doeu-me tão fundo
e pesa-me tanto
que até me parece
o peso do Mundo,
molhado de pranto!
uma flor de penas,
uma flor tão leve
que mal se descreve
num sentir, apenas,
mas tanto magoa…
como quem não esquece
e nunca perdoa!

Numa gota de água,
toda a imensidade
pode reflectir-se…
nessa flor de mágoa
e desilusão,
quanto mal profundo,
em dor, foi abrir-se
no meu coração

IN MEMORIAM

Foste bem meu irmão: nesta ansiedade imensa,
nesta louca miragem de Infinito,
onde o Verbo, em princípio, era ser Vida…
E, contudo, não houve recompensa:
visão interrompida,
na trágica paragem do teu grito,
e dúvida maior na minha crença…

TEMPESTADE

No céu tempestuoso,
uma nuvem de fumo se quedou:
uma nuvem de fumo desgrenhada,
que se deteve, ao longe…
(meu pensamento é fumo que se estampa
no limite sombrio da minha alma:
enervante, parado, alucinante e fixo…)
Porém, a tempestade há-de passar,
e a tarde, sacudindo as nuvens negras,
há-de erguer-se do escuro, luminosa,
transparente e suave;
o fumo há-de esvair-se…

Só eu continuarei na tempestade!

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

DIA INÚTIL

Um dia inútil foi a minha vida,
um dia morto sem razão de ser:
Dia sem sol, penumbra vaga, errante,
confusa, entre manhã de apreensão
e noite sem limites!
Comparsa eu fui, em esse drama de existir,
sem um fim a marcar uma presença,
um motivo… Talvez,
um complemento de outra vida estranha
que não fora acabada de viver:
um destino a cumprir
em outra maior pena!

LEMBRANÇA

Deixa ficar, na sombra do caminho,
a lembrança desfeita do meu ser;
envolve-a em puro linho,
e enterra-a, que ela, em morte, há-de esquecer.
Teu espírito será, nesse momento,
liberto da negrura desta vida:
há-de florir de luz teu pensamento;
serás na terra prometida!
Feliz, hás-de sonhar, ao sol dum novo dia;
e a paz virá bater à tua porta…
Tudo será, contigo, em harmonia,
quando a minha lembrança estiver morta…

INDECISÃO

Aquela indecisa
forma de sentir
atrasa os meus passos…
e tolhe os meus braços,
quando os vou abrir!
E nunca se realiza
o fim que se quer…
A forma de ser,
na minha inconstância,
redobra a distância,
que me desampara!
Não sei o que faço,
nesta indecisão:
Verdade em que minto,
mentira que sinto
e, às vezes, abraço
no meu coração!

VIA SINUOSA

Todos quiseram sempre que lhes desse
o muito que era seu…
sem que eu, em troca, nada recebesse
do pouco que era meu!
Agora, bem mais só que dantes fora,
nesta melancolia dolorosa,
- que de recordações! – Nossa Senhora!
que via sinuosa!
É uma angústia sem nome…
Pois não é só de pão que temos fome!

LUZ E SOMBRA

Quando eu vestia a sombra dos caminhos
de púrpura doirada,
quando eu queimava, a rir, minha alegria,
tinha na boca o sol da madrugada
e a graça de viver!
Era o meu coração tão leve e puro
como se eu acabasse de nascer!

Mas triste e vaga sombra desdobrou-se,
como peça de seda negra e baça:
era a noite… era a noite que chegara…
a que eu jamais em sonhos pressentira,
a que eu nunca esperara…

DESESPERO

Inútil e sombrio desespero:
eis o que resta da perdida imagem
da batalha da Vida… Já não quero
erguer, de novo, a lança, na miragem
de triunfos e glórias…nada espero…

O manto, esfarrapado, as ilusões perdidas
(inutilmente as ergo, as recomponho)
uma a uma se foram dispersando…
como pombas desertam! Já vencidas,
as minhas mãos cansadas vão lançando
ao revoltoso mar da minha inquietação
o que resta de sonho,
e coração
ainda a crepitar
para afogar…