quarta-feira, 10 de novembro de 2010

CAMPONESA

Ao Dr. Marques Crespo


Só falarei de ti,
(nada mais sei dizer…).
Oh Terra onde nasci
e onde quero morrer!

Há qualquer coisa em ti que me pertence
e será sempre minha;
só tua voz amiga me convence,
só ela me acarinha!
Mesmo distante, sempre estou a ver-te,
na poética lembrança que me invade ;
se meu coração ri e se diverte,
por ti, chora, desfeito de saudade!
Tu falas à minha alma com ternura
de mãe abençoada,
desde o romper da aurora à noite escura,
desde o sol-posto à luz da madrugada!
Eu sinto que me chama docemente
tua presença calma,
quando a tristeza imensa do poente
se reflecte nas sombras da minha alma!

Que me conserve Deus a minha casa,
na terra onde nasci,
e, na lareira, o fogo duma brasa,
onde a velha «boneca» me sorri:
Um «monte», apenas, branco, refulgente,
de «roda-pé» garrido,
aberto a toda a gente,
sempre de luz vestido!
Loiça vidrada, que saiu da feira,
para enfeitar,
e bilhas, frescas, sobre a «cantareira»,
para a sede de todos mitigar;
«arame» rebrilhante como espelho,
entre vasos de flores,
e esteiras novas de bonitas cores,
tingindo de alegria o chão vermelho…
Ambiente perfumado
de fruta pendurada e rosmaninho…
e pombas no beiral do seu telhado…
(Passam ranchos, cantando ao longo do caminho…)
Tudo ali resplandece, tudo brilha,
como um dia de festa!
Nos alegretes goivos e baunilha…
Ai, como a vida é boa assim modesta!

Eu, para ser feliz, não quero mais
do que este sonho, - simples aguarela:
à porta, uma latada e dois «poiais»,
e, sobre o poente, aberta, uma janela…
Gosto de ver o sol adormecer,
(graça que me ficou da alegre infância)
cerrando os olhos para anoitecer
nos longes azulados da distância!
A completar o quadro sossegado,
um oratório e cruzes de alecrim,
e a «bruxa» acesa, sobre o altar sagrado,
onde a saudade, um dia, há-de chorar por mim…
Esperarei tranquila, a minha sorte,
neste lugar…

E, sem medo da Morte,
a um lusco-fusco de oiro, hei-de passar…

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